Um golfinho de espécie nunca antes registrada em Fernando de Noronha apareceu morto na terça (24), na Ponta da Air France, no extremo Norte da ilha. Equipe do Projeto Golfinho Rotador submeteu o animal à necropsia, mas não foi possível identificar a causa da morte.
O cetáceo – um macho adulto com 2,02 metros – é um golfinho-pintado-do-atlântico, espécie encontrada, no Brasil, mais próxima à costa.
A carcaça do golfinho apareceu de manhã, numa área da praia com rochas e seixos. Por volta das 11h, moradores de Noronha avisaram ao Projeto Golfinho Rotador. O animal tinha uma pequena lesão na extremidade da mandíbula e hemorragia externa na região do ventre.
O recolhimento foi realizado por membros da equipe do Projeto Golfinho Rotador, do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio-Noronha) e da Administração do Distrito Estadual de Fernando de Noronha.
Ainda no local do encalhe os técnicos mediram o animal e tiraram fotografias. Os pesquisadores utilizaram equipamentos de proteção individual, fita métrica e material para coleta de amostras. A carcaça foi levada para a sede do Projeto Golfinho Rotador.
Durante a necropsia, os técnicos confirmaram o sexo por meio da observação dos testículos. Verificaram ainda que os rins e o fígado não apresentavam alteração. Havia presença de ar no tecido conjuntivo do pulmão (enfisema) e hemorragia.
A bióloga Priscila Medeiros, que coordenou o trabalho e é pesquisadora do Projeto Golfinho Rotador, não encontrou parasitas no intestino e no estômago do animal. Ela coletou amostras de tecidos para exames laboratoriais. O material será enviado para a Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), instituição parceira do Projeto Golfinho Rotador.
Como determina o procedimento padrão para esse tipo de ocorrência, a carcaça do golfinho foi envolvida com uma tela e enterrada para posterior coleta do esqueleto. Os ossos também guardam informações que podem auxiliar a equipe do Projeto Golfinho Rotador a identificar a causa da morte do animal. Participaram da necropsia ainda Vithor Macedo e Mariana Andrade, ambos biólogos do Projeto Golfinho Rotador.
A princípio a equipe ficou em dúvida se o animal seria um golfinho-pintado-do-atlântico (Stenella frontalis) ou golfinho-de-clymene (Stenella clymene). As duas espécies nunca haviam sido registradas em Fernando de Noronha. Após examinar a mandíbula do cetáceo, no entanto, concluíram que pela quantidade de dentes seria um golfinho-pintado-do-atlântico. Análise genética a ser realizada também pela UFES confirmará a espécie.
O pintado-do-atlântico, encontrado apenas no Oceano Atlântico, é como um primo do golfinho-rotador (Stenella longirostris). Os dois pertencem ao mesmo gênero: Stenella. Na classificação dos animais, o gênero corresponde ao primeiro e a espécie ao segundo nome.
Desde 1990, o Projeto Golfinho Rotador, que tem patrocínio da Petrobras, por meio do Programa Petrobras Socioambiental, monitora a ocorrência de cetáceos em Fernando de Noronha. A instituição acumula mais de 7 mil dias de observações sistemáticas do Mirante dos Golfinhos, do Forte do Boldró e do Forte dos Remédios. O Projeto Golfinho Rotador também atende comunicação de encalhes feitas por moradores do Arquipélago.
Segundo a Portaria do ICMBio No 43/2011, que criou a Rede de Encalhe e Informação de Mamíferos Aquáticos do Brasil (Remab), “encalhe é o evento no qual o mamífero aquático aparece morto em terra ou na água, ou, se ainda vivo, apresenta-se doente ou debilitado” e “ atendimento são as atividades de identificação, coleta de dados, resgate, reabilitação e promoção de soltura de mamíferos aquáticos”.
A Remab tem atuação em todo território nacional com a finalidade de otimizar o monitoramento e atendimento a encalhes e capturas em artes de pesca, bem como o desenvolvimento de pesquisa e armazenamento de informações em banco de dados nacional sobre mamíferos aquáticos, para viabilizar o intercâmbio de informações entre as instituições que trabalham com mamíferos aquáticos no Brasil. O Centro Golfinho Rotador é membro fundador e representante institucional da Remab em Fernando de Noronha.
Historicamente, a espécie que mais encalhou em Fernando de Noronha foi o golfinho-rotador (Stenella longirostris), seguido de golfinho-pintado (Stenella attenuata) e baleia-piloto (Globicephala melas).
O golfinho-pintado-do-atlântico é endêmico do Oceano Atlântico e ocorre principalmente sobre a plataforma continental, mas também habita águas oceânicas profundas, principalmente ao redor de ilhas oceânicas.
No Brasil, a espécie ocorre quase que exclusivamente sobre a plataforma continental e dificilmente habita águas profundas. Aparentemente existem duas populações distintas na costa brasileira, uma da Paraíba para o Norte e outra do Espírito Santo para o Sul.
As principais ameaças a essa espécie são as capturas acidentais em atividades de pesca, a concentração de contaminantes e a presença de patógenos. Também existe um caso de pneumonia de um exemplar encalhado no Rio de Janeiro.
Golfinhos também são atacados por vírus que os levam à morte. Em 2017 e 2018, centenas de botos-cinzas (Sotalia guianensis) foram encontrados mortos entre o litoral sul do Rio de Janeiro e litoral norte de São Paulo. Os pesquisadores que investigaram a causa da mortalidade dos botos-cinza encontraram como causa a infecção por um vírus da família do paramixovírus, a mesma do causador de sarampo em seres humanos.